Imigração portuguesa
Monumento na Praça Mal. Andréa
é um caso de amor
Sempre despertou curiosidade um pequeno monumento em forma
de gruta, localizado no lado direito da avenida sul-norte,
que vai em direção da parada de táxi
para o centro, onde está marcada a Rosa dos Ventos
e no qual antigamente existia um moinho eólico que
abastecia de água desde uma cacimba o logradouro
principal de nossa terra.
Esse monumento nada mais é do que um chafariz colocado
ali pelos imigrantes portugueses com a inscrição
da data de 1º de dezembro de 1895, marcando o ato da
devolução, pelos ingleses, das colônias
africanas e asiáticas aos lusitanos. Os de além-mar
e seus descendentes residentes em nosso município,
aproveitando esse mês em que comemoramos o momento
da fundação da povoação de Andréa,
resolveram homenagear a nova Pátria e o local que
os recebeu, para aqui se estabelecerem e formarem uma nova
vida.
Ainda hoje ele está aí, agora pintado de branco,
estático, comprovando a veneração daqueles
que para cá vieram com a nova nação
que escolheram. Foram os Sousa Castro, Estrelas, Peixoto
de Oliveira, Vasques Gonçalves, modernamente, os
Frascos e tantos outros. Se ele é simples e humilde
não importa. O que relevamos é a sua solidez,
que desafia o tempo, demonstrando a gratidão dos
homens, desde os colonizadores das terras de além-mar
até os últimos, que chegaram antes da 1ª
Guerra Mundial. Muito devemos a esta plêiade de braços
trabalhadores, que forjaram a nossa evolução
e deram base à economia santa-vitoriense.
Agora sintam, caros leitores, como um pedaço de pedra
e cimento pode proporcionar um caso de amor nas plagas verdes
desta região austral brasileira.
A srta. Arabela de Sousa e Castro, filha dileta de um dos
varões de nossa campanha pecuária, homem saído
do rude trabalho do campo, apaixona-se por um jovem imigrante
que chega da Serra da Estrela, do velho e querido Portugal,
a fim de lutar pela vida, através do comércio,
como todos os descendentes dessa família, os Estrelas,
mas andando pelas "campanhas". Pobre e honesto,
vislumbrava, pelo trabalho, um futuro melhor e acima de
tudo a formação de uma sólida família
nestes pagos meridionais do Brasil. Este era Pedro Estrela,
que sentia a repulsa dos familiares dela pela sua situação
financeira.
Quanto penou o jovem Pedro Estrela para conseguir ganhar
o gentil coração de Arabela, receber o sim
de Sousa Castro e finalmente o casamento se consumar!
A pressão era grande, a permissão não
era dada, o tempo estava se escoando e o jovem cada vez
mais apreensivo pelo perigo de darem a mão da amada
para um rico potentado daqui. Aí é que começa
a funcionar o sentido amigo dos conterrâneos e mesmo
de moços brasileiros e a tentativa foi feita.
A inauguração do chafariz seria na data em
que estava assinalada a homenagem. Todos preocupados com
a situação do jovenzinho português,
lhe propuseram que fizesse o discurso do ato, rememorando
os feitos do povo, nosso descobridor e a sua junção
com os mergulhões destas longínquas glebas.
Pedro, tímido, mas apaixonado, ressalvara que não
sabia fazer o trabalho aconselhado, mas que poderia lê-lo.
Aí entraram alguns intelectuais da cidade e formaram
um trabalho literário que Pedro Estrela soube apresentar.
Isto moveria o futuro sogro pela brilhante peça de
oratória e, quem sabe, abriria as portas para a aproximação.
E assim aconteceu: Pedro Estrela, na beira do chafariz que
até hoje está aqui, envolvido em nervosismo
e emoção, recitou as palavras que, embora
escritas por outros, estavam gravadas em seu coração.
Os patrícios e companheiros tinham razão.
Bernardino de Souza Castro dobrou sua teimosia e o namoro
foi consentido, e daí ao noivado e casamento, foi
um passo.
Surgiu uma família importante em nosso meio. Embora
a morte de Da. Arabela haja sido prematura, ela deixou uma
prole que ainda vemos transitar às nossas ruas, como
Helena, Betinho, Orlandinho, Zezinho e outros que não
estão mais neste mundo, e também seus netos
e bisnetos.
Conheci o velhinho Pedro Estrela em idade provecta, a palmilhar
à rua Treze em direção ao Clube Comercial.
Muito calmo e simpático com os seus pares, mas não
sei porque, carregava a tranqüilidade daqueles que
cumpriram com seu dever, em especial nossa terra, que adotou.
Dava-me a impressão que, ao passar pela praça
da cidade e encontrar-se com aquele monumento que lhe abriu
as portas do amor com um discurso feito pelos amigos lhe
dava uma profunda saudade da sua terra natal (mesmo contente
com a que adotou), mas principalmente da menina Arabela,
que sentiu que suas palavras não eram simples discurso,
mas uns versos de amor que iriam mudar os rumos de suas
vidas no chão de Santa Vitória do Palmar.
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