UM
MARINHEIRO DE ÁGUA DOCE E A MOCINHA DA ENSEADA DAS
CAPINCHAS
José Borges e Augustina Tugne Dupuy – Seu Botina
e Dª. Tina Uma Demonstração de Civismo
As
margens da lagoa Mirim sempre sussurrando no movimento,
que lhe dá o vento constante destas paragens, assistiram
o passar de mais duas figuras, que por si sós, ficaram
na evolução da vida cotidiana de muita gente.
Ele, o jovem fogoso, marinheiro de água doce, da
família dos Borges, ancorados em nosso desembarcadouro
que mais tarde viria a ser o mais austral porto do país,
o de Santa Vitória do Palmar. Esperança de
comércio legal ou não, viagens nos contatos
desta gente, para “dentro” ou para as terras
uruguaias. Ponto inicial o de término de penosas,
mas, bonitas travessias na lâmina azul de tão
puras águas que unem duas pátrias.
João Borges, amigos ou familiares, não sabem
a razão de possuir o apelido de BOTICA e que com
o passar dos anos, transformou-se no “Velho Botica”,
era marinheiro por profissão e imponente no tobadilho
de vetusto iate, percorria principalmente a rota Jaguarão
– porto local, trazendo areia grossa e levando lã
e couros.
Augustina Tugne Dupuy, neta da senhora Maria Tugne que veio,
talvez, Lion, na França e assentando-se nos campos
da hoje, sucessão Otílio Amaral, ao lado direito
da estrada do porto, a avenida Getulio Vargas, conhecida
pelo povo santa-vitoriense como “Faixa do Porto”,
chamada na intimidade de seus familiares, por Tina.
A dupla carinhosamente recebida e admirada ficou rotulada
pelo casal, seu BOTICA e Dª. TINA, que após
o matrimônio, passou a residir no próprio barco
que lhes servia de trabalho e lar. Tiveram dois filhos,
Nair Dupuy Borges e Erostildes Dupuy Borges.
O Velho Botica era um homem sério e de uma responsabilidade
muito comum nos homens que se dedicam a tão difícil
e perigosa profissão a de mestre barqueiro, conhecido
por todos que faziam o trajeto por esta via do sul e Dª.
Tina, sempre prestimosa e carinhosa, era o bálsamo
para seus filhos, parentes e amigos. Era bem quista dos
que a cercavam numa numerosa conjunção de
parentes e vizinhos, mesmo que seu lar possuía como
fronteira a imensidão da Mirim. Em cada porto que
chegavam, o barco de nome São Miguel, todo embandeirado
vinha navegando aprofundando na linha d’água
devido a carga que levava, aliás, o sustento dos
mesmos e o progresso da comunidade .
Quando a idade chegou avançando nos seus inexoráveis
ditames, fazendo com que a saúde não permitisse
tanto esforço e maior isolamento, o casal vendeu
o buque e passou viver na cidade, mas parar suas atividades,
jamais e como seu filho havia em determinada ocasião
de veraneio alugado o Hotel São Luiz, depois, do
Peixe, hoje chama-se Requinte, no Balneário Hermenegildo,
o venerando par foi para lá “passar o inverno”
e durante a estação estival. Transformou o
prédio, novamente em comércio de jogos, residência
da família e uma fart6a e deliciosa cozinha que serviu
por esse tempo(1956-57), aos passantes que se dirigiam à
“costa do mar”.
É nesse instante que, ainda não envolvido
com as cousas do magistério, assisti por várias
vezes a atuação deles e quando nos fins de
semana, uma turma de pescadores, boêmios etílicos
ou fanáticos freqüentadores daquele pequeno
núcleo de modestos ranchos de palha, para lá
se dirigiam, capitaneados por Aci de Azevedo, Nelson Vasques
Rodrigues e outros transportados no caminhão do Toscano
e do Ruivo.
Num determinado dia presenciei um ato de fé à
Pátria Brasileira proporcionado por eles e que jamais
tirei da memória. Era um 15 de novembro, data da
Proclamação da República e tendo a
funcionar a Escola Municipal do Hermenegildo, criada pelo
Prefeito João de Oliveira Rodrigues em 1953, no Clube
Recreio dos Veranistas, local cedido pela diretoria, para
que o mesmo desenvolvesse suas atividade ali, já
que, sem uso no período e com o testemunho de Francisco
Pires, apelidado de Chico do Cododácio (seu pai)
e que era aluno ali e agora morador da localidade, o VELHO
BOTICA, fardava-se de marinheiro, tendo como ajudante o
Nico Alves, popularmente conhecido por Coruja, vestido com
uma farda do Exército Nacional, emprestada pelo tenente
da Junta de Serviço Militar sediada em nossa cidade,
fazia-se acompanhar pelos alunos do educandário que
atravessavam o “campinho” e orgulhosamente se
postavam em atitude cívica e cantavam o Hino Nacional
Brasileiro, no momento em que o Velho Marinheiro hasteava
o Pavilhão Nacional, o querida representação
pictográfica de nosso pais e ainda sob o silêncio
e encantamento dos excursionistas de todos os sábados
e domingos, fazia-se a homenagem a tão importante
data. Os meninos e meninas da escola recebiam após
o ato, um punhado de “tijolinhos” como modesto
reconhecimento pela atitude dos mesmos. Naquele deserto
onde um grupo de estudantes e um casal veterano, ao som
do nosso Hino, acompanhados por todos, faziam referências
ao nosso sentimento de amor à terra natal, vivenciado
em sua grandiosidade do ato, pelo marulhar do portentoso
Mar do Hermenegildo.
O Velho Botica e a Dª. Tina, não estão
mais, no entanto, deram a sua contribuição
para a formação santa-vitoriense de trabalho,
vida familiar e um grande amor ao Brasil.
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