DORACÍVIO RODRIGUES
CORRÊA – O DORADO
O BOMÊMIO QUE NÃO GOSTAVA DAS NOITES DE LUAR
“que luar magnífico
....... ah! quando se tem
20 anos, todo o luar é magnífico ........
Carlos Cavaco
O DORADO, foi um desses homens que passaram em nossa comunidade
e que nas rodas da boemia e da amizade, deixaram impregnada
uma trajetória lúdica. Seu nome vinha de Doracívio
e não do ouro, por isso, era apelidado assim.
Nascido na década de 10, no interior do município,
veio para a pequenina cidade, em busca de cura para sua
precoce cegueira que completou-se, mais ou menos, aos 13
ou quatorze anos e à medida que a enfermidade avançava.
Como uma grande compensação, as grandes amizades
que juntou em sua vida foram se avolumando, principalmente
nas famílias tradicionais que possuíam filhos
contemporâneos seus. A sua total falta de visão
aconteceu numa ocasião durante as brincadeiras na
praça gal. Andréa, quando todos os seus amiguinhos
sentiram que o próprio passou a chocar-se com eles,
esbarrar em árvores, bancos e outros obstáculos.
Foi tamanha a consternação pelo trágico
destino do companheiro que após esse momento, lhe
dedicaram profunda ajuda, para sempre.
DORADO era bem quisto pela grande maioria da população,
que via nele uma maldade do destino e que nada podendo fazer,
o culminava com seu apoio desinteressado. Depois da morte
de seu pai, que era seu amparo, passou por grandes dificuldades
econômicas, mas nossa gente deu-lhe sempre a ajuda
necessária e por isso, nas famílias de Marcolino
Pereira, Juca Torino, Osman Azambuja, Domingos Perfetto
e tantos outros, passava seus dias ao convite cordial deles.
Sem uma faculdade importante que era a de enxergar, começou
a enveredar-se pelos caminhos dos sonhos, do verso e da
música. Aprendeu com Joaquim Torino, o Quinca, violão,
e conforme seu grande colega, embora muito menor do que
ele, vivia sempre musicando canções da época,
principalmente as serestas brasileiras, que não se
ouvem hoje em dia e das românticas e arrabaleiras
expressões do Prata, a valsa, o tango e a milonga.
Os, que o acompanham na foto exposta, seu Juca Torino e
os filhos, Dudu, Nabuco e os irmãos Azambuja, o Wilson
e Ivaldo, alem de tantos outros, como os rebentos do casal
Marcolino e Lucita, o Osvaldo, Wilson e Newton, faziam com
ele, uma parceria romântica, especialmente nas fantásticas
noites seresteiras nas ruas arenosas de nossa cidade e entre
os permeios dos ranchos do Hermenegildo, que ele amava tanto.
DORACÍVIO RODRIGUES CORREA, o DORADO, embelezava
sua alma de cego, tocando violão e cantando junto
a todos os citados, durante os períodos em que todos
dormiam, para acordá-los ao som de verdadeira música
quando ainda não existiam os ruídos de “sons”,
ou melhor, dos aparelhos eletrônicos, que tanto incomodam
aqueles que desejam um sossego, durante a sesta ou nos calmos
intantes noturnos. Era libidinoso, por excelência
e mesmo sempre estando pronto para uma saída, o que
mais gostava, era uma fugida aos cabarés da terrinha.
Na “COCA”, chamado de “duas tábuas”,
ali na Mirapalhete, passando o posto Ipiranga nº 2
e depois, na esquina da Osório com a João
de Oliveira Rodrigues, conhecida por “esquina do Pixinga”,
para continuar na Barra Preta, também nesta última
rua, ao lado do posto do Selo. Gostava de mulheres brancas
e uma peculiaridade, as que mais o encantavam, eram, as
que vestiam as meias francesas. A famosa dama da beleza
dos anos 30 Juraci Pires, o enlevava, embora nunca chegou
a enxergá-la. Vendo-a somente pela descrição
dos outros, fazia com que a mesma fosse uma das suas inspiradoras
nas doces serenatas.
DORADO era amigo de todos, embora, às vezes fosse
irracível e bravo, bradindo sua bengala para todos
os lados, mas logo voltava à serenidade costumeira
com seu caminhar bamboleante, à moda de Chaplin,
sempre guiado pela mão de um acompanhante da turma.
DORADO, só não gostava da noite com lua e
dificultava acompanhar aos cantores, como Humberto e Dudu,
Elias Suaya, Olavo Acunha e tantos outros, quando o pálido
astro estava no céu iluminando as ruas na procissão
cantante. Perguntado por que isso acontecia, ele respondia
que sentia pena profunda por não poder enchergá-la
mais. Que grande sentimento! E assim viveu DORACÍVIO
que conheci, ensinando violão e vendendo bilhetes
de loteria, que muitos compravam sistematicamente, para
ajudá-lo. Terminou sua existência triste por
não poder ver a vida, mas muito mais do que isso,
nunca mais assistiu um pôr-de-sol no seu Hermenegildo
e as belas mulheres brancas e pálidas que tanto o
enterneciam. Sempre dificultava as suas saídas em
noite de lua que ele detestava, somente por saber que não
poderia ver, como os demais, o luar calmo, romântico,
que lhe embalaria os seus momentos, como sentindo a expressão
de um seu contemporâneo, o Carlos Cavacos, que para
ele jamais chegaria, quando aquele poeta escreveu .......
“ mas que luar magnífico ... ah! quando se
tem 20 anos, todo o luar é magnífico.
DORACÍVIO RODRIGUES CORREA, foi um boêmio que
passou por aqui e que não querendo ver o luar, o
fazia, numa forma de protesto contra a ingratidão
e a dureza do destino. Grande vulto desta terra de 150 ANOS!
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Dorado de bengala, ao lado, de
Nabuco e Dudu Torino,
tendo na parte de trás Wilson Azambuja, Juca
Torino
e Evaldo Azambuja veraneando no Hermenegildo.
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