BALDUINO DO PANDEIRO E AS
MULATAS DO SUL
Sempre vivemos num mundo a parte até os inícios
de 1950 quando a estrada no Taím ligou-nos definitivamente
ao resto do país. Antes, éramos uma ilha de
dificuldades e de isolamento, mas, ao mesmo tempo, transformávamos
esta situação negativa numa maneira diferente
de atuar.
Tínhamos um jeito próprio de falar, vivíamos
com as necessidades e a cultura, para o sul, disfrutandos
das “carreteiras” seguras e a pequena distância
que nos deixava dentro da civilização uruguaia
com a fulgarante capital oriental, Montevidéo.
Éramos, realidade, um pequeno agrupamento de pecuaristas
nos vastíssimos campos, assombrados pela beleza e
as dificuldades de transitar pela lagoa ou andar pela costa
do mar. Tudo se fazia trágico, mas ao mesmo tempo,
sabíamos vencer este isolamento criando um modo de
viver diferenciado que tantas vezes encantou a gente que
por aqui chegava ao passar, trabalhar e a grande maioria,
ficar por estes lados mimetizados com esta gente exótica.
Um caso comum eram os artistas que por aqui transitavam,
principalmente, os circos andarilhos ou “Troupes”
de artistas mambembes que exerciam a sua profissão
e o trabalho, andando de povoado em povoado, de cidades
em cidades e na maioria das vezes, fugindo dos grandes centros
onde a concorrência era maior e os recurso ali postados
dificilmente os deixariam desenvolver o humilde papel desses
indivíduos.
Recordo, aqui nesta crônica, figuras como o artista
argentino, “Semillita”, comediante de mãos
cheias que encantava a nossa platéia com suas imitações
de grandes vultos do momento e muitas vezes, de pessoas
populares da comunidade. Também, lembro com saudade,
de um exímio músico apelidado de “Príncipe
Negro”, que lotava o Cine Theatro Independência
com sua figura estranha de negro grande e retação
que empunhando um saxonfone e vestido a caráter,
fazia-nos ouvir belíssimas canções
de todos os tempos.
Mas, aquele que mais encantava era o Balduíno e seus
pandeiros. Por que seus pandeiros? Eram estes a ferramente
de sua manifestação musical, já que,
enquanto cantava, ia usando um , em determinados momentos
fazia malabarismos com vários deles.
Parecia que ele era carioca, pelo sotaque e o jeito malandro
de caminhar como acontecia vermos nos filmes popularizados
como “Chanchadas” , tendo como destaques, os
galãs das novelas de radio, as vedetes do teatro
rebolado e dos impagáveis, como se dizia na época,
atores do palco brasileiro, como o grande Oscarito, Grande
Otelo, Ankito, Colé e tantos outros.
Balduíno chegava por estes lados da fronteira quando
o carnaval carioca terminava e ele fazia uma “Tourné”
por várias partes do Brasil.
Apresentava-se em nosso palco maior e em outros lugares
com sua ginga e a bossa permanente dos Homem dos Morros
do Rio de Janeiro e por isso, durante a sua estada, era
uma festa só. A gurizada o imitava tocando pandeiro
numa lata de goiabada e fazendo-o girar em torno de um dedo
ou de uma varinha. O Ducha, Tuca, o Fedor e tantos outros,
ficaram como prova do malabarismo e ritmo de Balduíno.
No entanto este era muito mais do que cantor e pandeirista.
Misturava-se na sociedade negra da cidade, mas também,
nas grandes rodas do Comercial e Caixeral e sempre com seus
instrumentos de trabalho, simpatia e nunca se ouviu dizer
que o negro Balduíno havia feito mal a alguém.
Mas, o que encantava era quando ele, em contato com gente
que gostava de batuque, sons, alegria, que eram e ainda
são, os negros e mulatos, escolhia as mais belas
conterrâneas dessa raça e formava um grupo
de “Pastoras” ( e as Pastorinhas pra o consolo
da lua vão cantando na rua, lindos versos de amor...)
imortalizadas na música de Noel Rosa e na letra de
João de Barro, o Braguinha. Passavam dias ensaiando
depois das horas de trabalho domésticos e iam apresentar-se
acompanhando-o e em muitas ocasiões, pela rua arenosa
da Barão do Rio Branco, desfilavam cantando e encantando
aos assistentes que na realidade, eram a maioria dos habitantes
da cidade.
É com carinho que destacamos algumas “mulatas”
do Balduíno eternizadas nesta foto abaixo e que muitas
já estão mais conosco, pois, partiram ao som
de uma batucada para o “nunca mais”...Olenca,
Dacila, Ladi, Gleci, Vilma e Tereza. Foram muito mais as
beldades santa-vitorienses escolhidas pelo músico
ritimista.
Ninguém sabe do fim que levou o Balduíno!!!
Talvez o progresso o aja deixado num canto. Quiçá
ficou batucando em algum pandeiro surrado, mas as “belas
Mulatas “umas estão conosco, outras partiram
ao som da “a estrela D’Alva no céu desponta
e a lua anda tonta com tamanho esplendor”, e ainda
atrevo-me em noites de Lua Cheia imaginar que o Balduíno
está alegrando com sua magia de sons em qualquer
lugar, porque deixou nestas amplitudes planas e verdes a
sua competência, arte e a união com as nossas
mulatas de pele morena e algumas de olhos verdes simbolizando
a beleza desta pátria brasileira que desde aqui,
fazemos parte com muito orgulho e amor.
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