Um
alemão e um baiano numa epopéia santa-vitoriense
Gumersindo Saraiva teve atuação política
dentro do município e por grande parte de País,
o que culminou com uma das maiores façanhas guerreiras
acontecidas. Teve a coadjuvá-la dois indivíduos
que não eram desta terra, mas aqui vivendo, transformaram-se
em amigos fiéis e seguidores da doutrina do grande
caudilho, que desprezou o título nobre de Barão
de Santa Vitória do Palmar oferecido por D. Pedro
II. Um adjetivo perpetuado na boca do senador Pinheiro Machado,
que inicialmente foi pejorativo, mas depois se transformou
num epíteto honroso, foi proferido pelo líder
gaúcho quando soube de sua morte em Carovi: "Parece
mentira que este 'sotreta' abalou a República".
O primeiro vulto foi Manuel "Duque" de Auch, artesão
alemão que para cá veio e se transformou numa
das figuras mais destacadas de nossa comunidade. Além
de deixar uma enorme família mimetizada na vida de
terra, construiu uma obra arquitetônica que hoje abrange
desde o Clube Caixeiral até a rua Sete de setembro,
onde estabeleceu sua moradia (onde depois abrigou o famoso
bar Tabajara, notando-se na parte alta do prédio
da esquina os símbolos maçônicos representando
sua crença nas idéias dos "Pedreiros
Livres" que criaram a maçonaria nestas plagas
do sul). Mesmo germânico, teve sempre admiração
e fé no País adotivo, a ponto de colocar uma
abóbada de louça simbolizando a parte central
da bandeira da República, recém-criada.
O Duque, como era conhecido, talvez tivesse esse nome não
pela nobreza da origem, mas sim pelos modos elegantes de
trajar. Contava José Benito de Los Santos que uma
vez, no porto de Rio Grande, quando um grupo esperava a
chegada de um navio que trazia membros da nobreza brasileira,
ele apareceu ali, e alguém teria dito: "Lá
vem um Duque". Cousas da História oral.
Este mesmo homem foi quem construiu uma chave para a fuga
do Caudilho de Curral de Arroios. Sendo de madeira, ela
se quebrou. Posteriormente, numa noite insone, elaborou
outra de ferro. Deu-se o escapo do grande líder para
o Uruguai, que depois, estaria envolvido na Revolução
de 1893, contra Floriano Peixoto e que o levou à
morte, no norte do Estado.
O outro companheiro foi um medico baiano, Ângelo Dourado,
que se estabeleceu em nossa cidade e aqui trabalhou em sua
nobre profissão. Quando Gumersindo, entrando por
Bagé deslocou-se até o norte do Paraná,
na luta contra a ditadura republicana, acompanhado por seu
irmão Aparício Saraiva (que depois seria um
dos grandes vultos pátrios castelhanos), Ângelo
Dourado o acompanhou e deu assistência profissional
às tropas beligerantes. Foi sempre um companheiro
de todas horas, principalmente nos conselhos que o velho
liberal desejava em tão difíceis momentos
e, mais do que isso, acompanhou-o até o seu último
suspiro, depois de haver sido baleado.
Ângelo Dourado deixou suas memórias gravadas
em seu famoso e eterno livro "Voluntários do
Martírio- Narrativa da Revolução de
1893" e pôde, evidentemente, à sua maneira
e ótica, descrever todo o caminho percorrido pelos
revolucionários que abalaram a República e
muito mais, em especial, como disse o senador Pinheiro Machado...
"este sotreta"...
Momentos de nossa História no século XIX que
deixaram marcas indeléveis, protagonizadas por dois
vultos que, vindos de fora - Manuel "Duque" de
Auch chegado da Alemanha e Ângelo Dourado das bonitas
terras da Bahia - se integraram na vida da gente mergulhona
destas "Neutrais Campinas".
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